As estiagens cada vez mais severas que impactam a Amazônia têm agravado a ocorrência dos incêndios florestais, uma realidade que, até pouco tempo atrás, era mais intensa no Pantanal e no Cerrado, mas que tem avançado sobre o bioma amazônico, cada vez mais seco e suscetível ao fogo, devido ao ambiente mais seco e o acúmulo de biomassa.
Em julho, foi sancionada a Política Nacional de Manejo Integrado do Fogo, que define e orienta a realização da “queima controlada” como técnica para uso agrossilvipastoril; e a “queima prescrita”, para conservação dos ecossistemas florestais, entre outras medidas do que é conhecido como “fogo bom”.
“Criamos o Comitê Nacional de Manejo do Fogo, que vai monitorar esses programas. Com o fogo controlado, usado de forma adequada, conseguimos fazer prevenção, sem afetar a fauna e a flora e mantendo a resiliência da floresta, porque ela se regenera e impede que o incêndio florestal ocorra”, diz André Lima, secretário extraordinário de Controle de Desmatamento e Ordenamento Ambiental Territorial do Ministério do Meio Ambiente (MMA).
O combate aos incêndios também vai prever incentivo financeiro para produtores rurais que se comprometerem com ações de prevenção e enfrentamento de focos de incêndio. A ideia do MMA é que o Plano Safra, principal instrumento de política pública do governo federal para apoiar o produtor agropecuário, passe a prever linhas de crédito com juros menores àqueles que aderirem às medidas de controle do fogo e ações preventivas.
“Estamos estruturando um plano para que o Plano Safra passe a prever um juro reduzido para quem se comprometer em adotar um plano de manejo de fogo. O objetivo é que isso seja incluído nos recursos repassados pelo Plano Safra”, diz Lima. “Haverá incentivo para o produtor que adotar tecnologias de monitoramento, estratégias de aceiro, minibrigada treinada, tanques de água instalados e equipamentos, por exemplo. Lidar com fogo é, primeiro, ter uma estratégia de prevenção. Depois, é se preparar para fazer um bom combate.”
Um mapeamento detalhado será feito a partir da criação do Sistema Nacional de Informações sobre Fogo (Sisfogo), uma ferramenta de gerenciamento das informações sobre incêndios florestais, queimas controladas e queimas prescritas no território nacional. Esse painel será mantido com dados inseridos por órgãos da União, Estados e municípios que atuem no manejo integrado do fogo.
A necessidade de regenerar a floresta também pode se converter em uma nova fonte de renda para a população local. Paulo Barreto, pesquisador sênior do Imazon, acredita que o combate ao desmatamento tem condições de ser transformado em uma oportunidade de negócios na Amazônia.
“É um paradoxo, mas a verdade é que o desmatamento criou uma oportunidade de restauração e, se o Brasil fizer a coisa certa, pode até lucrar. A restauração deve incluir serviços como a captura de carbono, criando mecanismos para captar recursos em larga escala”, diz Barreto. “Há municípios com áreas degradadas que podem se beneficiar desses investimentos e isso pode gerar melhorias na qualidade de vida e na economia local.”
Seja no combate a incêndios, no replantio da floresta ou em medidas preventivas, ambientalistas são uníssonos ao afirmar que não haverá meios efetivos de consolidar a Amazônia como um bioma protegido se isso não passar pelo envolvimento direto do cidadão.
“É preciso preservar a floresta, mas também oferecer uma boa condição de vida. Afinal de contas, as pessoas vivem ali. Precisamos sair desse cenário de caos absoluto que impera na região, ou em boa parte dela. A transição para uma economia verde deve ser acompanhada de medidas eficazes para criar uma nova indústria e promover a restauração”, afirma Barreto.
Os especialistas também chamam a atenção para a destinação de terras públicas como ponto crucial, além do controle e fiscalização de cadeias de valor associadas ao desmatamento, como a pecuária, o que passa diretamente pelo setor privado.
“Se a pressão dessa cadeia continuar na região, mesmo com mudanças de governo e leis, o desmatamento pode voltar. Portanto, é necessário um controle disciplinado e constante, similar ao que a área econômica faz no combate à inflação, por exemplo”, diz o pesquisador do Imazon. “É preocupante saber que tudo isso pode mudar, conforme cada governo. Por isso, é importante incluir o setor privado, para que ele atue nessa virada de chave”, afirma.