Os centros de votação no Uruguai abriram suas portas no domingo, dando início às eleições gerais, nas quais os uruguaios decidirão entre a permanência da atual coalizão de centro-direita, liderada hoje pelo Partido Nacional do atual presidente Luis Lacalle Pou, ou o retorno da esquerda ao poder.
A esquerda é liderada pela Frente Ampla, tradicionalmente encabeçada pelo ex-presidente José Mujica. Em meio a campanhas modestas e apatia generalizada, o voto dos eleitores indecisos será crucial para a esquerda, que governou por 15 anos consecutivos e busca retornar ao poder após a derrota em 2019.
“Foi uma campanha distante da população, que não alcançou os níveis de mobilização que o Uruguai historicamente tem, onde a adesão aos partidos é uma das mais altas da América Latina”, afirmou à Associated Press o analista político Julián Kanarek.
A poucos dias da votação, as principais pesquisas apontam como favoritos o esquerdista Yamandú Orsi e sua companheira de chapa Carolina Cosse, colocando o opositor Frente Ampla com mais de 40% das intenções de voto. Em segundo lugar aparece Álvaro Delgado, candidato do governista Partido Nacional, com entre 20% e 24% do apoio, seguido por Andrés Ojeda, representante do conservador Partido Colorado, com entre 12% e 17%.
Para ser eleito, qualquer candidato precisa superar 50% dos votos válidos, o que dá aos indecisos — estimados entre 10% e 14% — um papel decisivo. Caso nenhum candidato atinja esse percentual, os dois mais votados disputarão o segundo turno em 24 de novembro.
No mesmo dia, serão realizados dois plebiscitos, nos quais o voto — ao contrário da eleição presidencial — não é obrigatório.
O primeiro, apoiado pelo governo, aborda as crescentes preocupações com a insegurança e propõe a revogação da proibição constitucional de batidas policiais noturnas em residências. Atualmente, as buscas só são permitidas durante o dia e mediante ordem judicial.
A segunda consulta popular, mais polêmica, propõe uma reforma previdenciária impulsionada por sindicatos e organizações sociais para restabelecer a idade de aposentadoria em 60 anos, após ter sido elevada para 65 pelo governo de Lacalle Pou.
A proposta também sugere equiparar o valor das aposentadorias e pensões ao salário mínimo nacional e, no ponto mais controverso, eliminar os fundos de pensão privados, transferindo todas as contribuições para o sistema público, o que gerou acalorados debates sobre seu impacto fiscal. “É um plebiscito complexo porque nem a esquerda está de acordo”, destacou Kanarek.
As pesquisas preveem uma vitória da Frente Ampla, que, se confirmada, retornaria ao poder após cinco anos e depois de governar entre 2005 e 2020.
Contudo, em meio à apatia dos eleitores, nenhum candidato conseguiu se destacar de forma contundente.
Embora a eleição de Lacalle Pou em 2019 tenha representado uma virada após 15 anos de governos da Frente Ampla, o carismático presidente — que deixará o cargo com uma aprovação de 50% dos uruguaios — não pode se reeleger e também não conseguiu transferir seu capital político para seu sucessor, Álvaro Delgado.
Além disso, a participação popular nas primárias de junho foi a mais baixa da história, com apenas 35% dos eleitores votando, já que o voto não era obrigatório.
Especialistas atribuem essa baixa adesão ao fato de que os cidadãos não acreditam que este ciclo eleitoral trará “mudanças fundamentais”.
Os projetos dos dois blocos principais apresentam semelhanças, com foco em melhorar a competitividade do país, reduzir as desigualdades econômicas e diminuir a taxa de pobreza infantil, num país onde uma em cada cinco crianças vive abaixo da linha da pobreza.
No Uruguai, uma das economias mais estáveis da América Latina, a política se caracteriza mais pelo “debate de nuances do que por extremos”, destacou o politólogo Agustín Canzani, em contraste com outros países como México, Brasil ou Estados Unidos. “É um vaivém entre um bloco de centro-esquerda e outro de centro-direita”, que, segundo ele, tem estruturado o cenário político “pelo menos nas últimas duas décadas.”