A valorização do iene no mercado global de câmbio e consequente desmonte de operações de “carry-trade”, que beneficiam moedas de alguns países emergentes, voltaram a pressionar o real nesta semana e impuseram uma perda de quase 1% da moeda brasileira em relação ao dólar. Na sessão desta sexta-feira, bastou a divisa japonesa se recuperar ante o dólar após dados de inflação nos Estados Unidos para que moedas como o real e o peso mexicano apagassem todos os ganhos observados no início da sessão.
As operações de “carry-trade” consistem em tomar recursos de países com juros baixos, como o Japão, e alocá-los em ambientes de taxas altas, como o Brasil, de forma que o investidor ganhe com o diferencial entre as taxas. No entanto, supostas intervenções cambiais no Japão, a possibilidade do Banco do Japão (BoJ) voltar a elevar a taxa de juros e a perspectiva de queda das taxas em boa parte do mundo desenvolvido — com especial atenção aos Estados Unidos — deram força ao iene, o que levou o mercado a abandonar o carry-trade.
Em seu relatório semanal, a Commcor avalia que a extensão da apreciação do iene e seu efeito sobre o mercado de câmbio como um todo indica um “movimento orquestrado e de amplitudes globais” de realização de lucros com o “carry-trade”, e não simplesmente algo provocado pela suposta intervenção cambial no Japão. Na visão dos profissionais da corretora, o mercado pode estar se antecipando a uma postura mais dura do BoJ ao mesmo tempo em que outros bancos centrais de economias fortes, como o Federal Reserve (Fed), sinalizam que devem cortar juros em breve. Vale lembrar que o Banco Central Europeu e o Banco do Canadá, por exemplo, já iniciaram o processo de flexibilização monetária.
“Querendo ou não, os momentos de alta do iene foram acompanhados por alta em demais divisas de economias fortes, enquanto moedas de economias emergentes ‘pagavam a conta’ e caiam, a exemplo do real, que já está novamente pressionado e com momentos de dólar próximo a R$ 5,70”, diz a Commcor no relatório.
O Bank of America (BofA) foi um dos grandes players do mercado a pausar uma operação de carry-trade que apostava na valorização do real contra o iene. Na última quarta-feira, o banco americano interrompeu o negócio quando a moeda brasileira atingiu o nível de 28 ienes, após ter iniciado a operação quando o real era cotado a 29,9 ienes em 23 de abril.
“O real continua significativamente subvalorizado diante de sólidos fundamentos – crescimento econômico robusto, inflação baixa, grandes superávits comerciais – mas provavelmente funcionará como um amortecedor dos possíveis riscos da política comercial em torno das eleições nos EUA”, dizem os estrategistas do BofA.
Na visão de Athanasios Vamvakidis e Claudio Piron, estrategistas que assinam o relatório semanal de câmbio do banco, os investidores podem ficar relutantes em retomar as operações de carry-trade com o iene mesmo depois que a correção esfriar, já que o mês de agosto promete ser de maior volatilidade à medida que se aproximam as eleições presidenciais nos Estados Unidos e mudanças na postura de grandes bancos centrais.
Para eles, os fundamentos que deram sustentação ao carry-trade no primeiro semestre permanecem, mas a correção em julho pode ter ocorrido porque muitos investidores entraram nas operações quando o iene já estava muito desvalorizado em relação ao dólar. “Tendo entrado na negociação a descoberto do iene tão tarde, até mesmo pequenos movimentos poderiam ter acionado o ‘stop loss’ (paralisação repentina de uma operação), principalmente para investidores de ‘real money’, que também tendem a ter posições maiores”, explicam Vamvakidis e Piron.