Os partidos políticos trocaram a anistia total de suas dívidas por uma proposta de “Refis” em que estarão totalmente anistiados de juros e multas sobre os valores cobrados pelo governo e pela Justiça Eleitoral, além de terem 15 anos para pagarem os débitos “a critério do partido”, incidindo apenas a correção monetária sobre o montante original.
O texto é a nova versão da proposta de emenda constitucional (PEC) “da Anistia”, que a maioria dos partidos políticos — do PT ao PL — tentou aprovar ano passado em uma comissão da Câmara, mas não obteve apoio suficiente por causa de resistências a mudanças na cota de candidaturas femininas. As cotas para mulheres ficaram de fora da nova redação para diminuir a oposição.
A PEC ficou parada por meses, em negociação nos bastidores, e agora entrou diretamente na pauta do plenário da Câmara. O relator, deputado Antônio Carlos Rodrigues (PL-SP), ainda não divulgou oficialmente seu parecer, mas o Valor teve acesso a uma versão preliminar.
O projeto reduz o percentual de recursos públicos para as candidaturas de pretos e pardos. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) determinou em 2020 que o repasse fosse proporcional ao número de candidatos de cada raça — se 50% dos candidatos fossem negros, eles teriam que receber 50% do fundo eleitoral. Pela PEC, essa fatia mínima será de 20%.
O TSE terá que divulgar quanto cada partido terá que repassar em verbas para as candidaturas femininas e de pessoas pretas e pardas logo após o registro das candidaturas. A conta será feita apenas no âmbito nacional, sem necessidade de atendimento proporcional em cada um dos Estados ou municípios do país.
A PEC também determina que haverá a anistia das irregularidades cometidas em eleições anteriores com as cotas raciais e que novas políticas afirmativas para minorias só terão validade se instituídas por lei — ou seja, não poderão mais ser criadas pela Justiça Eleitoral, como ocorreu com as cotas para mulheres e negros.
Criada este ano, a bancada negra na Câmara indicou que tende a se opor a parte das mudanças e quer exigir a proporcionalidade do recursos de forma regional.
Outra questão tratada na PEC é o parcelamento das dívidas dos partidos. A ideia de uma anistia mais ampla sobre todas as dívidas e multas aplicadas pelo Poder Judiciário foi abortada, diante da repercussão negativa na sociedade e no Judiciário. A proposta agora é instituir um “Refis” de débitos, sem especificar quais seriam abrangidos, com parcelamento em até 180 meses.
Pela versão mais atual da PEC, os partidos poderão aderir “a qualquer tempo” e terão isenção de dos juros e multas acumulados, aplicando-se apenas a correção monetária sobre os montantes originais. O pagamento dessas obrigações ocorrerá em até 15 anos, “a critério do partido”.
A lei atual já prevê o parcelamento em até 60 meses (cinco anos), mas, segundo advogados, muitas vezes a Advocacia-Geral da União (AGU) rejeita os pedidos. Se a PEC for aprovada, o prazo de parcelamento será definido pelo próprio partido e caberá a AGU apenas homologa-lo.
Não há regras adicionais sobre o funcionamento desse Refis no texto obtido pelo Valor, mas os envolvidos negam que existirá a possibilidade de que o partido poderá estabelecer, por conta própria, um prazo de carência para iniciar o pagamento ou inscrever nesse Refis dívidas privadas, com fornecedores.
A PEC ainda reafirma a imunidade tributária dos partidos e determina que terão anistiadas todas as “sanções de natureza tributária” por órgãos da administração pública direta e indireta. Com isso, eles não poderão ser obrigados a devolução de valores, pagamento de juros ou multas pelas condenações.
Segundo advogados que participaram da negociação da PEC, isso visa garantir que não haverá cobrança de impostos sobre imóveis ou bens dos partidos e anular autuações da Receita Federal, que costumavam ocorrer antes dos anos 2000 e que até hoje estão em litígio no Judiciário. A imunidade é a mesma garantida a templos religiosos e sindicatos.