O presidente Luiz Inácio Lula da Silva voltou a defender, nesta segunda-feira, uma maior “harmonização” nos procedimentos adotados pelos bancos centrais do Mercosul como forma de “reduzir custos” e beneficiar pequenas e médias empresas da região. Além disso, Lula afirmou que o Mercosul precisa aprofundar, ainda neste ano, o diálogo para um “acordo abrangente com a China”.
Lula falou sobre o assunto durante discurso na abertura da cúpula do Mercosul, que ocorre hoje, em Assunção, no Paraguai. Como mostrou o Valor na edição de hoje, Lula encontrou, nesta reunião, um clima mais hostil entre todas as cúpulas das quais ele já participou desde seu primeiro mandato, em 2003. Isso porque trata-se da primeira reunião do bloco com Javier Milei na presidência da Argentina.
O líder ultraliberal já confirmou que não participará do encontro, mas no Palácio do Planalto e no Itamaraty existem receios de que, mesmo ausente, ele poderá causar transtornos e constrangimentos ao Brasil.
A nova postura argentina se soma à do presidente uruguaio, Luis Alberto Lacalle Pou – que, embora menos incisivo do que Milei, já se colocou em encontros anteriores como antagonista e crítico de Lula. O petista tem boa relação com o paraguaio Santiago Peña, mas não tem alinhamento político com ele.
Mesmo ausente da cúpula, Milei esteve em solo brasileiro no último sábado para participar de uma cúpula conservadora, onde se encontrou com o ex-presidente Jair Bolsonaro e outras lideranças da extrema-direita internacional. No poder há menos de um ano, o argentino já tem um histórico de atritos com Lula, a quem já chamou abertamente de “corrupto” em diversas ocasiões, sem retratação.
A Argentina será representada em Assunção pela chanceler Diana Mondino. Apesar de ela adotar tradicionalmente um tom comedido, o Itamaraty vem encontrando dificuldades para que Buenos Aires concorde em firmar uma declaração conjunta condenando a tentativa de golpe sofrida em 26 de junho pela Bolívia, o mais novo membro pleno do bloco.
O comunicado vem sendo negociado entre os diplomatas dos membros fundadores do Mercosul (Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai), além dos bolivianos. Um dia após a tentativa de golpe na Bolívia, o Mercosul emitiu nota em que rejeitava “qualquer tentativa de mudança de poder por meio da violência e de forma inconstitucional que atente contra a vontade popular, soberania, autodeterminação dos povos e que vulnerabilize a estabilidade política e social do país irmão”.
Apesar disso, Milei afirmou acreditar que a tentativa de golpe havia sido fabricada pela gestão do presidente boliviano, Luís Arce. Em sua conta no X, ele afirmou que “a fraude montada na Bolívia é conhecida, e o perfeito idiota, em vez de admitir seu erro, me critica por deixar sua estupidez à vista”.
Interlocutores do governo brasileiro admitem que são grandes as chances de a Argentina causar constrangimentos sobre esse tema em Assunção. Dos agora cinco membros plenos do bloco, o líder único do campo de esquerda, além de Lula, é Luís Arce. Mas ele está rompido com outro aliado histórico de Lula, o ex-presidente Evo Morales – que, assim como Milei, vem disseminando a tese de golpe fraudado.