A indústria mineral brasileira apresenta um desempenho melhor que a média global, que vive um ciclo de retração em suas receitas e investimentos. Em 2023, o setor faturou R$ 248,2 bilhões no Brasil, um recuo de 0,7% em relação ao ano anterior. No primeiro semestre de 2024, o faturamento cresceu 8% em relação ao mesmo período do ano passado, alcançando R$ 129,5 bilhões, de acordo com o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram).
O cenário global é adverso. O faturamento das 40 maiores mineradoras do mundo, entre elas as brasileiras Vale e CSN, deve recuar pelo segundo ano consecutivo, segundo o Relatório Global Mine, da PwC. Em 2023, essas 40 empresas obtiveram uma receita de US$ 845 bilhões, 7% inferior à do ano anterior. Para 2024, a projeção é de recuo de 6%, com receita conjunta estimada de US$ 792 bilhões.
Essa retração é resultado de um ciclo de baixa nos preços de importantes commodities, como níquel, lítio, cobalto, bauxita, estanho e zinco, que estão com cotações inferiores às de 2022. O minério de ferro, principal item da indústria mineral brasileira, que chegou a ser vendido por US$ 220 por tonelada em 2021, no início de setembro flutuava abaixo de US$ 100 por tonelada. “Vivemos uma desaceleração da atividade industrial global, principalmente na China, que é a maior consumidora de minério de ferro”, diz a consultora Patrícia Seoane, sócia da PwC Brasil. “Além disso, os investimentos globais em transição energética e as vendas de veículos elétricos evoluem de forma mais lenta que o previsto”, complementa. A queda nas receitas globais induziu grandes mineradoras a retraírem projetos de expansão. Segundo a PwC, os investimentos em capex (bens de capital) das 40 maiores do mundo caíram de US$ 168 bilhões em 2022 para US$ 132 bilhões no ano passado – e a estimativa é que fiquem em US$ 98 bilhões neste ano.
Apesar da retração global, os investimentos da indústria mineral devem crescer no Brasil. A estimativa do Ibram é de aportes que somam US$ 64,4 bilhões no país entre 2024 e 2028, um crescimento de 28,8% em relação ao quinquênio de 2023 a 2027. Essa alta ocorre por uma maior destinação de recursos para projetos de apoio, que não representam expansão mineral. Os investimentos socioambientais devem crescer 62,7% e somar US$ 10,67 bilhões, sendo a descaracterização (desativação) de barragens de rejeitos a principal atividade prevista. Os recursos para melhorias logísticas deverão somar US$ 10,36 bilhões, uma alta de 133%.
Há também aumento dos investimentos em minerais considerados estratégicos para a transição energética, por serem utilizados em painéis solares, aerogeradores, baterias de veículos elétricos e componentes eletrônicos. Os recursos destinados aos projetos em terras-raras deverão crescer 870,6%, para US$ 1,45 bilhão. Os investimentos em lítio devem subir 174,8%, alcançando US$ 1,19 bilhão. Estão programados US$ 4,4 bilhões em níquel (alta de 89,9%) e US$ 600 milhões em titânio (297,4% a mais).
Entretanto, para Raul Jungmann, presidente do Ibram, o crescimento dos investimentos em minerais estratégicos ocorre sobre um patamar historicamente muito baixo. “Mesmo se dobrarmos os valores programados, ainda estará aquém do potencial do país”, diz. “Falta uma estratégia pública adequada para aproveitar as oportunidades do mercado global.”
Falta uma estratégia para aproveitar as oportunidades do mercado global”
— Raul Jungmann
O Brasil possui a maior reserva mundial de nióbio, a segunda de grafita, a terceira de terras-raras e é o quinto maior produtor de lítio. No entanto, recebe apenas 3% dos investimentos globais em prospecção de metais não ferrosos. “Os recursos vão para os países com alto mapeamento geológico. Não é o caso do Brasil”, diz o consultor Afonso Sartorio, sócio da EY Brasil. Enquanto grandes produtores, como Canadá, Estados Unidos, Austrália e África do Sul, conhecem em detalhes seus distritos minerais, o Serviço Geológico Brasileiro (SGB) disponibiliza o mapeamento de apenas 27% do território nacional na escala 1:100.000, a mínima necessária para o início de um projeto de prospecção mineral.
A prospecção é uma atividade de alto risco e é desempenhada principalmente por empresas menores, as “junior companies”, que depois vendem o direito de lavra para as “majors”. No Brasil, a falta de recursos financeiros para investimentos de risco inibe a atividade. É aguardada no setor a confirmação pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) do lançamento de um fundo de investimento de até R$ 1 bilhão para exploração mineral por empresas de pequeno e médio porte. O fundo, anunciado no início do ano, está em fase de formatação.
De acordo com o Ibram, a atividade mineral é destino de só 0,9% dos recursos do setor financeiro dedicados às atividades produtivas no país, e apenas quatro mineradoras são listadas em bolsa. Outro problema é a lentidão no licenciamento ambiental, que leva em média sete anos. Entre a descoberta de uma jazida e o início da produção, são consumidos 22 anos no Brasil, enquanto a média mundial é de 15 anos. “As regras de licenciamento são boas, o que precisa melhorar é a agilidade do processo”, diz Sartorio.
Os investimentos estão progredindo e a tendência é positiva”
— Gustavo Pimenta
Um estudo realizado pela EY indica que o Brasil é o país com a maior carga tributária sobre a atividade mineral, em comparação com outros grandes produtores. A inclusão no projeto de reforma tributária de um imposto seletivo de 0,25% sobre o minério de ferro desagradou o setor. “O excesso de tributação retira competitividade da produção nacional e reduz a atratividade dos investimentos”, afirma Jungmann.
A indústria mineral brasileira mantém uma forte dependência do desempenho do minério de ferro, que respondeu por 62% do faturamento do setor no primeiro semestre, com R$ 80,1 bilhões. É também a substância que recebe a maior fatia dos investimentos. Na projeção do Ibram para 2024 a 2028, o minério deve receber 26,8% dos recursos, somando US$ 17,27 bilhões. Mas a expansão é de apenas 2,1% em relação ao quinquênio anterior.
Os principais investimentos em minério de ferro no país são da Vale. A companhia realiza a expansão das minas de ferro Vargem Grande e Capanema, em Minas Gerais, e da mina S11D, em Canaã dos Carajás (PA). Juntas, vão acrescentar mais 50 milhões de toneladas anuais na capacidade produtiva da empresa até 2026. “Os investimentos estão progredindo conforme o cronograma e a tendência é positiva em direção à meta de produzir entre 340 [milhões] e 360 milhões de toneladas de minério de ferro em 2026”, afirmou o executivo Gustavo Pimenta, eleito, em agosto, pelo conselho de administração para assumir a presidência da Vale no final do ano. Depois, a companhia reviu a projeção para chegar 2026 com mais de 360 milhões de toneladas produzidas.