Manifestantes tomaram as ruas de mais de 100 cidades francesas para criticar a decisão do presidente, Emmanuel Macron, de indicar Michel Barnier como seu novo primeiro-ministro. Lideranças do bloco de esquerda, que venceu as eleições legislativas de julho, exigiam que a tradição fosse cumprida e que tivessem o direito de ocupar o posto, mas a ideia foi vetada pelo Palácio do Eliseu, um movimento comparado a um golpe durante os protestos.
De acordo com os organizadores, 300 mil pessoas foram às ruas da França, sendo que 160 mil apenas na capital — as autoridades foram mais conservadoras, apontando que o número total ao redor do país foi de 110 mil, sendo que 26 mil em Paris. A AFP apontou que cinco pessoas foram detidas por porte de itens proibidos, fogos de artifício e por danos ao patrimônio público.
Na quinta-feira, após dois meses de impasse para a definição do novo primeiro-ministro, Macron anunciou o nome de Michel Barnier, integrante do partido Os Republicanos, de centro-direita, para liderar o Gabinete ministerial. De 73 anos, o político foi eleito deputado pela primeira vez em 1978, e ocupou pastas ministeriais — desde Assuntos Europeus até Relações Exteriores — nos governos de Jacques Chirac e Nicolas Sarkozy. Também foi duas vezes comissário europeu e foi o negociador para a saída do Reino Unido da União Europeia, o processo que ficou conhecido como Brexit.
Em comunicado, o Palácio do Eliseu afirmou que Macron “assegurou que o primeiro-ministro, e o futuro governo, reuniriam as condições necessárias para serem tão estáveis quanto possível e para terem a possibilidade de reunir o maior número possível de pessoas”. Bernier já deu início ao processo de formação de seu gabinete, e sinalizou que está aberto a trabalhar com representantes de todos os lados do espectro político, inclusive a esquerda.
A indicação foi imediatamente recebida com críticas pelo bloco de esquerda, que tem em Mélenchon sua figura mais popular: desde a votação, ele reivindicava que, seguindo a tradição, a coalizão apontasse o novo premier, uma vez que foi a mais votada nas urnas — pelos resultados finais, a Nova Frente Popular conquistou 193 cadeiras na Assembleia Nacional, um resultado até certo ponto surpreendente dado o bom desempenho da extrema direita no primeiro turno, em junho. Mas no mês passado, Macron foi enfático ao rejeitar o nome de Lucie Castets, indicado pelo bloco de esquerda, e lançar uma nova rodada de negociações, afirmando que estava evitando uma “instabilidade institucional” na França — segundo os argumentos do presidente, Castets não sobreviveria a um voto de não confiança no Parlamento. “Nós temos agora um primeiro-ministro completamente dependente do Reagrupamento Nacional (RN)”, disse Castets neste sábado, se referindo à principal sigla de extrema direita da França, e que sinalizou que não necessariamente votará contra o premier indicado por Macron, mas cobrou que suas demandas sejam levadas em consideração.
Nas ruas francesas neste sábado, o tom contra o presidente Macron, cuja taxa de rejeição chega a 70%, segundo números do final do mês passado, era de revolta, em meio a acusações de “golpe antidemocrático” e a pedidos para que deixe o cargo imediatamente. “A Quinta República está em colapso” disse à AFP a manifestante Manon Bonijol. “Votar (para o Parlamento) será inútil enquanto Macron estiver no poder. Um sentimento compartilhado por outros manifestantes em Paris. “ Macron recusa submeter-se aos resultados das urnas”.
“Os jovens se manifestaram de forma muito clara contra o RN. Mas o presidente ignora os nossos desejos com as costas da mão. Esta mobilização de 7 de Setembro não deve ser a última”, disse Éléonore Schmitt ao Le Figaro.
Em um carro de som, Mélenchon, que desde o anúncio de Bernier tem afiado seus ataques ao governo, prometeu que seu bloco fará um voto de censura ao novo governo na Assembleia Nacional, condenou o que chamou de “golpe antidemocrático”, e afirmou que a eleição “foi roubada dos franceses”. Pendurada no carro de som, uma faixa dizia: “Pela democracia, pare o golpe de Macron”.
“Emmanuel Macron poderia ter nomeado Lucie Castets como primeira-ministra. Ele não fez isso, porque a gente pretendia implementar o nosso programa!”, disse Mélenchon. “Você [Macron] está acostumado a trapacear! Nós não! Aconteça o que acontecer, votaremos pela censura a tal governo”.