O diretor do Banco Central responsável pela decisão sobre uma possível intervenção no câmbio sinalizou que não puxaria o gatilho para qualquer medida de alívio do dólar sem antes obter total apoio da diretoria da autoridade monetária.
Galípolo é cotado como a escolha do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para assumir a presidência do BC assim que o mandato de Roberto Campos Neto terminar, em dezembro. Isto coloca o diretor em uma posição difícil, em que tem de se equilibrar entre um chefe de Estado que exige que se combata o que ele vê como especulação e, por outro lado, investidores que estão desconfortáveis com a crescente influência de Lula no BC. O governo também clama por taxas de juro mais baixas, enquanto os mercados apostam que os juros irão na direção oposta.
O dólar acumula alta de quase 11% no ano, o que deixa o real como a moeda emergente de pior desempenho depois do peso argentino. A moeda teve alívio na semana passada, quando Lula deixou de comentar sobre o câmbio e o governo anunciou cortes de gastos.
“A decisão de intervenção é típica do diretor de política monetária e do presidente” do BC, disse Luiz Fernando Figueiredo, ex-diretor de política monetária do banco central e atualmente presidente da Jive Investments.
“O câmbio flutuante é o nosso regime. O BC deve entrar em momentos de falta de liquidez ou precariedade na formação do preço”, acrescentou Figueiredo. Houve “muitas falas em rádio, em entrevistas de maneira cada vez mais calorosa”.
As decisões de intervenção no mercado cambial viriam de Galípolo, sob quem operam as mesas de negociação do Banco Central. Durante anos, o presidente da instituição também precisou aprovar quaisquer ações antes da sua implementação.
No entanto, à medida que a pandemia de covid-19 perturbava os mercados nacionais e globais, o diretor de política monetária recebeu autonomia para realizar operações cambiais utilizando até 5% das reservas internacionais do Brasil, que atualmente se situam perto de US$ 360 bilhões. Embora essa liberdade permaneça em vigor hoje – com um limite inferior, de 2,5% das reservas – Galípolo sinalizou que ainda procuraria o consentimento de outros membros do alto escalão do banco.
Em discursos públicos, integrantes do BC, incluindo Campos Neto e Galípolo, atribuíram o estresse recente nos mercados a “ruído de curto prazo”, apontando para incertezas sobre o futuro fiscal e monetário do país. Eles não chegaram a sinalizar qualquer tipo de intervenção no mercado cambial. A posição do BC em relação à moeda, por sua vez, levou Lula a alegar que existe um uma “especulação” que “não é normal”.
Integrante do BC enfatizam frequentemente que não têm uma meta para a taxa de câmbio. Mas, assim como acontece em muitos mercados emergentes, uma valorização sustentada do dólar pode aumentar os custos dos bens importados, pressionando a inflação. No caso de falta de liquidez ou de sinais de disfunção do mercado, o Banco Central pode anunciar operações de swap cambial ou intervir no mercado à vista comprando ou vendendo dólares.
O Banco Central não quis comentar.
As tensões entre Lula e o BC devem aumentar com a decisão do Copom de interromper em junho um ciclo de flexibilização monetária de quase um ano, sem sinalizar a retomada dos cortes. Galípolo juntou-se à votação unânime do Copom para manter a Selic em 10,5%, depois de ter discordado a favor de uma redução maior na reunião anterior.
Entre os operadores, há apostas de que o BC elevará os juros neste ano. A preocupação é que os investidores possam antecipar um aumento nos preços por conta da pressão do dólar e, consequentemente, elevar as suas estimativas de inflação ainda mais acima da meta de 3% do BC. Se esse aumento persistir no tempo, poderá tornar inevitável outro ciclo de alta de juros, segundo Italo Abucater, chefe da mesa de câmbio da Tullett Prebon.
Em meio a uma forte desvalorização do real, a maneira mais prática e eficaz de reagir seria vendendo dólares, disse ele, acrescentando que essas vendas gerariam “mais segurança a investidores estrangeiros para naturalmente trazerem o fluxo de volta”.