Nos últimos anos, o Brasil tem enfrentado uma sequência alarmante de desastres ambientais que afetam profundamente o ecossistema e, de maneira ainda mais silenciosa, a saúde mental da população. A frequência e intensidade de incêndios florestais, chuvas torrenciais e secas severas estão deixando um rastro de destruição em várias regiões do País, intensificando uma sensação de angústia coletiva que, para muitos, está se tornando insuportável. O Brasil, uma nação conhecida por sua biodiversidade exuberante, em 2024, foi palco de uma marca histórica alarmante: sua maior cidade respirou o pior ar do mundo, fruto de queimadas descontroladas e poluição crescente. Para muitos, a pergunta é inevitável: qual será o futuro se continuarmos nesse ritmo?
O impacto ds mudanças vai muito além da devastação física. As florestas queimadas, as cidades alagadas e os campos secos estão causando também um abalo psicológico na população. A ecoansiedade, termo usado para descrever o medo crônico de desastres ambientais e a angústia frente à crise climática, já é uma realidade para muitos brasileiros. Estudiosos e profissionais da saúde mental estão preocupados com os efeitos a longo prazo dessa nova forma de ansiedade, que tem se mostrado muito comum entre os jovens.
Os incêndios florestais estão aumentando a uma taxa alarmante. Segundo dados do Greenpeace, houve um crescimento de 80% nas queimadas na Amazônia e no Pantanal em comparação com 2023. Apenas entre janeiro e agosto de 2024, mais de 50 mil focos de incêndio foram registrados na Amazônia, o maior número desde 2010. No Pantanal, 12,2% de sua área total foi devastada, representando uma perda incalculável tanto para o meio ambiente quanto para as populações locais, cuja subsistência depende da preservação do bioma.
Chuvas intensas trouxeram destruição ao Rio Grande do Sul, onde enchentes deixaram 179 mortos, 34 desaparecidos e milhares de famílias deslocadas. Esses eventos extremos não apenas revelam a urgência da crise climática, mas também jogam luz sobre a vulnerabilidade humana diante da natureza.
A necessidade de discutir a ecoansiedade cresce a cada ano, especialmente em uma nação que vê suas riquezas naturais ameaçadas diariamente. A psicoterapeuta Caroline Hickman, especialista no tema, descreve a ecoansiedade como uma resposta psicológica direta à crise climática, caracterizada por sentimentos de insegurança, tristeza e medo. Segundo ela, as pessoas não estão só preocupadas com o futuro do planeta. Estão lidando com a perda de seu bem-estar emocional e de suas esperanças por um futuro mais sustentável.
Um estudo realizado pela Unicef com 3 mil jovens brasileiro de 16 a 24 anos revelou dados alarmantes: 57% dos entrevistados relataram sentir altos níveis de estresse relacionados ao clima. O mais preocupante é que apenas 16% desses jovens estão envolvidos em iniciativas para combater as mudanças climáticas, o que indica uma desconexão entre a percepção do problema e a ação concreta para solucioná-lo.
Com esse cenário, é necessário que tanto a sociedade civil quanto as empresas e governos atuem de forma coordenada para oferecer estratégias eficazes no combate à ecoansiedade e na promoção de um futuro mais sustentável.
- Envolvimento ativo e educação ambiental: Estudos da Universidade de Stanford indicam que pessoas que participam de iniciativas ambientais, como programas de plantio de árvores, mutirões de reciclagem ou ações de preservação de ecossistemas, apresentam níveis mais baixos de ansiedade climática. Isso ocorre porque o envolvimento ativo em ações de proteção ambiental cria uma sensação de controle e pertencimento a uma comunidade que trabalha para o bem comum.
- Terapia climática e reconexão com a natureza: Especialistas sugerem que a ecoansiedade deve ser reconhecida como uma resposta à crise climática e tratada como tal. Práticas como mindfulness, grupos de apoio e a simples proximidade com a natureza têm mostrado resultados positivos. Mariana Napolitano, pesquisadora ambiental, aponta que a interação com ambientes naturais ajuda a regular a pressão arterial, melhora a função cognitiva e contribui para uma sensação geral de bem-estar.
- Ações governamentais e responsabilidade corporativa: A ecoansiedade também é impulsionada pela percepção de inação por parte de líderes políticos e empresariais. Casos como o Neubauer vs. Alemanha mostram que a juventude está se mobilizando para pressionar governos a adotarem medidas mais rigorosas contra as mudanças climáticas. No Brasil, as empresas podem desempenhar um papel crucial na mitigação desses impactos, adotando práticas sustentáveis, investindo em energias renováveis e assumindo compromissos para reduzir sua pegada ambiental.
Para os CEOs de grandes empresas, a ecoansiedade pode ser vista como um indicador de que a sustentabilidade não é mais apenas uma questão de responsabilidade social, mas também de viabilidade econômica. Empresas que se comprometem com práticas ambientais sustentáveis estão não só ajudando a mitigar os efeitos da crise climática, mas também construindo uma marca forte e resiliente, capaz de atrair uma nova geração de consumidores que valoriza o impacto social e ambiental de suas escolhas de consumo.
Além disso, há um claro benefício em adotar políticas que promovam o bem-estar de seus funcionários. A promoção de espaços de trabalho verdes, o incentivo à participação em projetos ambientais e o oferecimento de suporte psicológico para lidar com a ecoansiedade são apenas algumas das maneiras de as empresas se posicionarem como líderes nessa nova era.
Governos, empresas e sociedade civil precisam se unir e tomar atitudes para a preservação do meio ambiente e o bem-estar das gerações futuras. A ecoansiedade pode ser um catalisador para a ação. Ela nos lembra de que o tempo de agir é agora, e que cada pequena ação conta na construção de um futuro mais saudável e sustentável.
O Brasil, com sua vasta riqueza natural e biodiversidade, tem uma responsabilidade global. Ao enfrentar esses desafios de frente, podemos não apenas proteger nossas florestas e rios, mas garantir que nosso povo tenha um futuro com menos ansiedade, mais esperança e uma relação equilibrada com a natureza.
Luciana Brafman é fundadora da produtora Time To Act, se dedica há anos à interseção entre arte e ativismo climático. Tem mais de 20 anos de experiência em projetos premiados, incluindo duas indicações ao Emmy por seu trabalho em Survivor, The Apprentice e The Big Give, de Oprah Winfrey. Na Time to Act lidera a criação de projetos imersivos sobre sustentabilidade, combinando sua expertise de Hollywood com um enfoque em impacto social e ambiental. No campo das artes visuais, é embaixadora do LACMA e possui formações pela Parsons School of Design e pelo NEDE Institute, em Berlim.
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