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Como é a percepção pública do balanço da presidência de Joe Biden nos EUA | Mundo

Redação
por Redação

O presidente dos EUA, Joe Biden, acaba seu mandato com um abismo entre seu histórico de realizações e sua reputação pública.

O democrata passou tanto tempo empenhado em problemas de longo prazo que muitos eleitores sentiram que ele não lidou de forma adequada com questões imediatas, como a inflação, que deu um salto em 2022, e as travessias ilegais de migrantes na fronteira entre EUA e México.

O mandato de Biden acaba justo quando muitos de seus principais feitos na economia interna ainda estão sendo implementados, de forma que a história de sua presidência continuará a ser escrita por muito tempo depois que ele entregar a Casa Branca ao republicano Donald Trump. Segue um resumo dos principais elementos do histórico interno de Biden:

Curou a ‘febre’ econômica da pandemia

Meses após assumir a presidência, Biden, junto com os democratas no Congresso, aprovou um pacote de US$ 1,9 trilhão para impulsionar os EUA e tirar o país crise econômica da pandemia de covid-19.

O pacote incluiu pagamentos diretos de US$ 1,4 mil à maioria das famílias no país. Governos estaduais e locais estiveram aptos a receber US$ 350 bilhões em assistência. Os sistemas escolares receberam US$ 130 bilhões. As famílias tiveram acesso a um maior crédito tributário relacionado aos filhos, depositado mensalmente em suas contas bancárias. Houve uma moratória temporária de despejos para proteger os locatários. De forma similar aos auxílios anteriores do governo Trump, foram concedidos benefícios mais altos para os desempregados e empréstimos especiais, que não precisam ser saldados se suas condições forem cumpridas, para pequenas empresas pagarem as folhas de pagamento.

Além disso, houve US$ 14 bilhões destinados à distribuição da vacina contra a covid-19, o que levou cerca de 70% do país a ficar totalmente imunizado, segundo agência federal Centro de Prevenção e Controle de Doenças (CDC, em inglês).

Esse dinheiro ajudou a impulsionar o crescimento econômico — foram criados 17 milhões de empregos, cerca de 5,6 milhões a mais do que a previsão do Gabinete de Orçamento do Congresso (CBO) antes da aprovação do pacote de ajuda. Os eleitores, contudo, começaram a se preocupar mais com outra métrica econômica que começou a crescer: a inflação.

Nunca houve uma única causa para a inflação que assombrou a presidência de Biden, nem uma solução satisfatória o suficiente para população. Os republicanos foram rápidos em atribuir a culpa aos gastos com o pacote de ajuda contra a pandemia, recorrendo a previsões, como as do economista Larry Summers, para dizer que Biden inundou os EUA com dinheiro demais. Essa discussão política obscureceu uma realidade muito mais complexa, envolvendo múltiplos fatores que iam além do auxílio contra a pandemia.

Fábricas em todo o mundo fecharam durante a pandemia. Houve falta de chips para fabricar novos carros, de eletrodomésticos, de contêineres para navios e de trabalhadores nos portos para entregar às pessoas a tempo os produtos que haviam comprado. Os preços subiram em razão dos gargalos na cadeia de suprimentos mundial, uma situação que o governo Biden tentou resolver melhorando a eficiência dos portos dos EUA.

De início, a produção interna de petróleo demorou a acompanhar a recuperação econômica, o que elevou os preços da gasolina. Então, em 24 de fevereiro de 2022, a Rússia invadiu a Ucrânia, o que fez os preços das fontes de energia e dos alimentos dispararem ainda mais. Biden recorreu à reserva estratégica de petróleo dos EUA pela segunda vez em sua presidência. A taxa anual de inflação do índice de preços ao consumidor atingiu o pico de 9,1% em junho de 2022, a maior em quatro décadas. O Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA) jogou os juros básicos para cima, o que elevou as taxas dos financiamentos imobiliários e dos empréstimos para automóveis, enquanto a taxa de inflação caía apenas gradualmente e ainda apontava o elevado patamar de 2,9% em dezembro.

Biden destacou, com orgulho, que a inflação havia cedido sem a recessão prevista por muitos economistas, um argumento que, em grande medida, não conseguiu transmitir ao grande público. Ele também criticou as companhias petrolíferas, acusando-as de lucros abusivos, e as empresas alimentícias que reduziram o tamanho de seus produtos, a chamada “reduflação”.

Dados do Departamento do Trabalho mostram que os preços ao consumidor subiram um total de 20,8% ao longo do mandato de Biden, enquanto os rendimentos semanais médios aumentaram apenas 17,4% no mesmo período. Dessa forma, os rendimentos da população não acompanharam o aumento das despesas — o que, previsivelmente, levou as pessoas a ver como fraca uma economia saudável em outros aspectos.

À medida que a economia dos EUA melhorava, houve um forte aumento nas travessias ilegais na fronteira dos EUA com o México. O maior número de imigrantes não autorizados sobrecarregou muitos Estados e cidades enquanto o governo Biden discutia com o Congresso sobre como adicionar mais recursos para a segurança da fronteira. O eventual acordo de Biden com os republicanos do Senado foi sabotado por Trump no início de 2024. Isso levou Biden a decretar — tarde demais para a percepção pública — ações executivas, algo que segundo os republicanos ele deveria ter feito desde o início.

Ainda assim, o impacto foi claro. As prisões do governo na fronteira sul ultrapassaram 2 milhões no ano fiscal de 2022 e no ano fiscal de 2023. O número caiu para 1,53 milhão no ano fiscal de 2024, de acordo com a agência de Proteção de Alfândega e Fronteiras (CBP). Os republicanos culparam as chegadas de migrantes pelo agravamento da falta de moradia e pelo aumento dos preços dos imóveis, embora a economia também tenha se beneficiado em certa medida, uma vez que a migração impulsionou o crescimento do emprego sem aumentar as pressões salariais que poderiam ter piorado a inflação.

As detenções na fronteira sul diminuíram depois de o México adotar ações mais agressivas em dezembro de 2023 para restringir as travessias e de o governo dos EUA lançar um sistema on-line chamado “CBP One”, que permite a pessoas não autorizadas e interessadas em ganhar status de imigração entrarem no país com agendamentos pré-estabelecidos.

Semana da infraestrutura? Estava mais para uma década de infraestrutura

A “semana da infraestrutura”, eventos nos quais o assunto deveria ganhar destaque na comunicação da Casa Branca, tornou-se motivo de piada durante o governo Trump. Rotineiramente, nas diversas semanas da infraestrutura anunciadas no governo Trump o assunto acabava sendo o ofuscado por outras notícias ou controvérsias. Além disso, Trump havia prometido consertar as estradas e pontes do país, mas teve pouco sucesso.

Biden adorava alfinetar Trump, em função do acordo de infraestrutura de US$ 1 trilhão sancionado pelo democrata em novembro de 2021 e que teve apoio dos dois principais partidos americanos. Até o momento, foram anunciados 66 mil projetos com um valor de US$ 568 bilhões, embora grandes construções, como a ponte Brent Spence na área de Cincinnati e novos túneis ferroviários na Costa Leste, ainda levarão vários anos até sua conclusão — um atraso que abafou parte do entusiasmo que as obras poderiam ter despertado nos eleitores. O governo Biden salientou ter sido rápido em colocar em prática uma série de novos programas, mas o que importou politicamente foram os atrasos em mostrar efeitos visíveis na vida das pessoas.

Os atrasos também tiveram sérias implicações econômicas, possivelmente tendo prejudicado os esforços de Biden para incentivar mais pessoas a comprar veículos elétricos (VEs). A lei alocou US$ 7,5 bilhões para construir uma rede de postos de abastecimento, mas a materialização dos gastos têm sido lenta. No fim de 2024, a Agência Rodoviária Federal informou que apenas 214 carregadores operacionais haviam sido construídos em 12 Estados, embora 24,8 mil projetos estejam programados em todo o país. Esse atraso se deu enquanto a China começava a ampliar a pleno vapor sua própria produção de VEs, desafiando as montadoras americanas, europeias, japonesas e sul-coreanas.

Em entrevista ao jornal “USA Today” em janeiro, Biden disse que gostaria que houvesse mais projetos prontos cujas obras já pudessem ser iniciadas e lamentou não ter feito um trabalho melhor na divulgação de todos os benefícios e projetos que suas políticas públicas ajudaram a iniciar.

Chips de computador, inteligência artificial e a competição com a China

Por anos, a China superou os EUA na indústria graças aos investimentos feitos pelo governo em fábricas. A equipe de Biden decidiu competir com a aprovação de um plano bipartidário em 2022 que investiria US$ 52 bilhões em novas fábricas de chips de computador. O investimento ajudou a trazer para os EUA a produção dos chips mais avançados e a depender menos de Taiwan e da Coreia do Sul, onde eventuais cortes no acesso a rotas marítimas poderiam desestabilizar a economia dos EUA.

Esse apoio tornou-se ainda mais importante à medida que a inteligência artificial emergiu como uma força econômica, motivando um decreto executivo de Biden em 2023 para orientar o uso da tecnologia emergente. No entanto, assim como os projetos de infraestrutura, as novas fábricas beneficiadas pela lei levarão tempo para serem concluídas e ampliarem a produção, o que significa que boa parte do legado de Biden poderá se desenrolar durante a presidência de Trump.

A mal nomeada Lei de Redução da Inflação

Em agosto de 2022, Biden sancionou a Lei de Redução da Inflação (IRA, na sigla em inglês), apoiada pelos democratas, que pouco fez para aliviar as pressões inflacionárias imediatas e, apesar do nome, na verdade funcionou como uma grande sacola no qual se colocaram várias políticas públicas.

A lei incluiu US$ 783 bilhões em vários incentivos e políticas para promover as fontes de energia renováveis e enfrentar os impactos das mudanças climáticas, além de subsídios para as pessoas conseguirem seguro-saúde pela Lei de Assistência Médica Acessível. Biden, orgulhosamente, chamou a lei de “o maior investimento sobre as mudanças climáticas em qualquer lugar do mundo”, embora a afirmação seja reflexo tanto da magnitude da lei quanto dos esforços relativamente modestos do passado para enfrentar o desafio climático.

bidenomics_2 — Foto: arte Valor

Biden financiou esses gastos em parte permitindo que o Medicare (sistema de saúde do governo federal para idosos) negociasse preços mais baixos de medicamentos vendidos com receita, o que reduziu custos para os contribuintes, embora os novos preços da primeira rodada de negociações só entrem em vigor em 2026. O governo também fez mudanças no código tributário e aumentou o financiamento para a Serviço de Receitas Internas (IRS, a Receita Federal dos EUA), elevando a arrecadação recolhida dos contribuintes mais ricos.

Biden acabou admitindo que as provisões da lei relacionadas às mudanças climáticas para tentar afastar as fontes de energia americanas dos combustíveis fósseis eram mais importantes do que a mensagem política de curto prazo de reduzir os preços.

“Eu gostaria de não tê-la chamado assim porque tem menos a ver com reduzir a inflação e mais com fornecer alternativas que geram crescimento econômico”, disse Biden em um evento de arrecadação de fundos em Utah em 2023, embora acrescentando acreditar que, com a lei, “estamos literalmente reduzindo o custo das pessoas para conseguirem atender às suas necessidades básicas”.

Bipartidarismo e esforço para proteger o bolso do consumidor

Biden adotou uma abordagem de duas vias em questões que, em grande parte, passaram despercebidas no radar da população. Ele tentou conseguir vitórias bipartidárias no Congresso em questões de violência armada, assistência médica para veteranos militares e casamento entre pessoas do mesmo sexo. Já seus indicados para liderar agências federais se concentraram em mudar regras para ajudar os consumidores e tornar a economia mais transparente, em alguns casos convencendo empresas a eliminar cobranças ocultas voluntariamente.

O Agência de Proteção Financeira do Consumidor (CFPB) concluiu em janeiro uma regra para remover US$ 49 bilhões em dívidas médicas dos históricos de crédito das pessoas. Outra regra limitou as taxas de cheque especial cobradas por bancos e cooperativas de crédito. Três grandes sites de aluguel de apartamentos concordaram em divulgar cobranças ocultas associadas a contratos de locação após pressão do Departamento de Habitação e Desenvolvimento Urbano. O Departamento de Transportes concluiu uma regra em 2024 exigindo que as companhias aéreas fornecessem reembolsos em dinheiro quando voos fossem cancelados ou sofressem grandes alterações.

Dívida nacional cresceu com veto de republicanos a aumento nos impostos

O mandato de Biden chega ao fim com a trajetória da dívida nacional em pior situação.

Dados do CBO mostram que o custo de serviço da dívida triplicou desde que Trump deixou o cargo. Em parte, a pandemia foi responsável por isso, já que o déficit orçamentário anual ultrapassou os US$ 3 trilhões em 2020, durante o último ano do primeiro mandato de Trump. Em 2021, o déficit foi de US$ 2,77 trilhões em razão da ajuda adicional relacionada à covid-19, mas nunca voltou aos níveis pré-pandemia, com o déficit anual que precisou ser financiado por dívida em 2024 chegando a US$ 1,83 trilhão.

O governo Biden propôs orçamentos com aumentos de impostos para reduzir a dívida, mas os republicanos vetaram a ideia. Os parlamentares do Partido Republicano argumentam que o perdão da dívida estudantil defendido por Biden agravou a situação. Muitos dos cortes de impostos promovidos por Trump em 2017 estão prestes a vencer após este ano e o presidente eleito promete mais cortes, o que pode elevar ainda mais os déficits orçamentários caso não sejam acompanhados por grandes reduções nos gastos.

Forte crescimento no governo Biden — Foto: arte/valor
Forte crescimento no governo Biden — Foto: arte/valor

Fonte: Externa

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