O bombardeio de informações e o apelo às compras durante a Black Friday, que teve início oficialmente nesta sexta-feira (29), podem despertar diferentes sentimentos nos consumidores, como medo e arrependimento — antes, durante e após o evento.
“Quem se programou para comprar provavelmente fez pesquisas, comparou preços, sabe qual produto é o melhor. Ou seja, está menos vulnerável a comprar o que está fora da lista”, diz Sarah Tuyani, psicóloga e pesquisadora em comportamento de consumo pelo Centro Universitário de Brasília.
Contudo, organizar a lista de compras não deixa os consumidores imunes ao medo de perder uma oportunidade ou de se arrepender após uma compra. “A Black Friday tem promoções de curto período, o que faz com que mesmo o consumidor que se planeja, veja uma oportunidade de compra que não quer perder”, afirma a psicóloga.
Para Tuyani, a técnica mais persuasiva dos anúncios promocionais da Black Friday é a escassez. Ela afirma que, ao limitar a quantidade de produtos e o tempo para as compras, o consumidor tende a atribuir mais valor à mercadoria.
A técnica, aliada à presença massiva na mídia, foi aplicada em uma ação estratégica para a edição deste ano pelo Mercado Livre. A plataforma de e-commerce utilizou mais de 2.500 telas digitais em locais públicos (“out of home”) para a exibição simultânea de cupons de desconto exclusivos em relógios de rua, pontos de ônibus e bancas de jornais, em cinco capitais, entre a 17h e 18h na véspera da data de Black Friday (28).
A ideia da estratégia é que, durante esse período, quem estivesse nas ruas, só “visse o Mercado Livre pelos lados”, diz Pethra Ferraz, vice-presidente de marketing do Mercado Pago na América Latina. “Tem impacto, tem a recordação gerada pela frequência, então acreditamos que é muito eficiente do ponto de vista de conversão de negócios”, diz a executiva.
Além do medo de perder uma oferta limitada, é possível que o consumidor tenha receio de se arrepender de comprar um produto, de acordo uma pesquisa feita pela Shopper Experience, da HSR Specialist Researchers, com 1.000 entrevistados, focada nos impactos da Black Friday nos sentimentos dos consumidores.
O estudo mostra que 22% expressaram medo de um possível arrependimento pós-compra, e 34% costumam se arrepender de terem adquirido algum produto.
Segundo Tuyani, que assina o artigo acadêmico “Persuasão e emoções: fraudes ao consumidor na Black Friday Brasil” com o acadêmico João Modesto, a origem desse sentimento pode estar atrelada à preocupação do cliente de ser vítima de golpes ou promoções fraudulentas. “O medo não é algo ruim porque faz com que você seja mais cauteloso ao comprar”, ela acrescenta.
A Black Friday, tradicionalmente associada a grandes promoções, desafia a crescente conscientização ambiental dos consumidores. A pesquisa da Shopper Experience também aponta que 59% de seus entrevistados não se preocupam com o impacto ambiental das compras realizadas na Black Friday.
Segundo a psicóloga Sarah Tuyani, o dado pode ser explicado pela mudança de comportamento que o evento causa temporariamente nos consumidores. “A característica [de escassez] pode contribuir para que as crenças que eles tenham ao longo do ano percam temporariamente a relevância na tomada de decisão”, afirma.
Ela menciona ainda a influência dos fatores socioeconômicos. A percepção de escassez, gerada pela limitação das ofertas, e a busca por vantagens financeiras, especialmente em tempos de instabilidade econômica, podem levar as pessoas a tomar decisões impulsivas. Esse comportamento, estimulado por táticas de marketing que exploram a emoção e a urgência, evidencia a ausência de autonomia para fazer escolhas que “priorizem produtos e serviços que prezem pelo impacto ambiental.”
*Participantes do Curso Valor de Jornalismo Econômico sob supervisão de Mônica Scaramuzzo