A família Índio da Costa, acionista do Banco Cruzeiro do Sul (BCSul), acusa o Fundo Garantidor de Créditos (FGC) de ser um dos culpados pela quebra da instituição financeira, ao parar de fazer aportes, após um acordo entre as partes em 2011. No ano passado, em primeira instância a Justiça paulista condenou o FGC a pagar R$ 4,350 bilhões relativos a esses aportes. Mas agora, o FGC ganhou um aliado de peso.
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A função do FGC, no âmbito do Raet, era tentar salvar o Cruzeiro do Sul, encontrando um comprador no mercado, o que não foi possível. Assim, logo em seguida, em setembro de 2012, foi decretada a liquidação extrajudicial.
“A decretação do Raet no BCSul decorre de sua própria situação econômico-financeira e das graves irregularidades detectadas em sua gestão e não seria evitada pelos aportes de valores pelo FGC no Fundo ACB, realizados e a efetivar”, aponta o BC na sua petição.
O BC ressalta ainda que, no movimento seguinte, as causas da decretação da liquidação extrajudicial não tiveram relação com eventual inadimplemento do contrato entre FGC e BCSul. “O que em verdade causou a liquidação extrajudicial da instituição financeira, diferentemente do que consta da sentença recorrida, foi o passivo a descoberto existente mesmo com o aporte de recursos do FGC, além da grave e contumaz violação de normas do CMN e do BCB, caracterizada pelas inúmeras fraudes contábeis e financeiras perpetradas pelos próprios ex-administradores do BCSul”.
A autarquia destaca ainda, que a sentença de primeiro grau, “ao condenar o FGC a pagar vultosa indenização para reparar prejuízos alegadamente suportados pelo BCSul, está, em verdade, a premiar, por um lado, a gestão criminosa realizada pelos ex-controladores e ex-administradores da instituição financeira; e, por outro, a punir a instituição que protegeu os depositantes e investidores vítimas daqueles crimes falimentares”.
Quando apelou a decisão em primeira instância, em janeiro deste ano, o FGC já tinha alegado que “com a liquidação extrajudicial, evidentemente, já não fazia mais nenhum sentido manter em vigor um negócio que era destinado justamente a evitar que aquele evento ocorresse”. “Considerando que a finalidade da operação objeto do instrumento estava frustrada por completo, as partes decidiram em consenso interromper a sua execução. […] Não tendo o BCSul, evidentemente, jamais se queixado do fato, pelos oito anos subsequentes”, diz a peça, feita pelos escritórios Nery e LUC Advogados
O documento do FGC afirma ainda que, considerando o contexto e condições expressas nas duas operações de liquidez celebradas entre o FGC e o Cruzeiro do Sul, “chega a ser difícil de compreender como alguém possa concluir que o FGC deu causa à falência do banco”. Aponta que, depois de emprestar mais de R$ 5 bilhões ao BCSul antes da liquidação extrajudicial, o FGC, após essa medida, ainda devolveu mais de R$ 1,8 bilhão a depositantes do banco, no seu papel de garantidor de créditos. “Vale dizer: o BCSul custou ao Sistema Financeiro Nacional cerca de R$ 7 bilhões. E ainda assim quebrou”.
A apelação afirma ainda que o Cruzeiro do Sul “quebrou por conta da administração não apenas incompetente, desastrosa, mas, ao que tudo indica e ao ver do Ministério Público Federal, criminosa, fraudulenta, empreendida por anos a fio justamente por aqueles que são agora, nestes autos, benevolentemente agraciados pela sentença apelada”.
O caso tem chamado atenção do setor bancário porque coloca em xeque a função primordial do FGC. A Associação Brasileira de Bancos (ABBC) também pediu para entrar como “amicus curiae” ao lado do fundo.
A família Índio da Costa trava uma guerra contra o FGC, com pelo menos quatro processos distintos. Além desse sobre a interrupção dos aportes, há outro em que os acionistas acusam o fundo de utilizar um relatório da empresa IMS para fraudar a contabilidade do banco, levando o BC a decretar sua quebra. Em um terceiro, credores minoritários questionam o fato de o FGC ter resgatado antecipadamente um CDB do banco em setembro de 2012, 48 horas antes da decretação de liquidação judicial da instituição.
No quarto processo, o Ministério Público do Estado de São Paulo (MPSP) entrou com ação civil pública contra o FGC pedindo indenização por danos morais coletivos por ter supostamente lesado milhares de credores do Cruzeiro do Sul.
Nesse processo sobre o resgate do CDB, quem pediu para entrar como “amicus curiae” ao lado do FGC foram a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) e a Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi). “Reputar uma operação livremente encetada de ineficaz, fazendo-o a partir da aplicação de um diploma normativo que não é e não pode ser aplicável ao agente econômico em crise (Banco Cruzeiro do Sul) coloca em risco a lógica subjacente do regime jurídico de resolução de crises de instituições financeiras. […] Tal sistema normativo, como se viu, tem a finalidade de preservar o interesse público na higidez do Sistema Financeiro Nacional, protegendo a economia popular de crises bancárias”, aponta a petição da Febraban.
Segundo a entidade, ao se invalidar operações como o resgate do CDB pelo FGC, “corre-se o risco de proceder transferência de recursos da coletividade a indivíduos sem que essa medida se reverta em qualquer benefício à sociedade”.