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Europa vive instabilidade política inédita, que está afetando a economia | Humberto Saccomandi

Redação
por Redação

A Europa atravessa um momento de instabilidade política inédito na história recente. França e Alemanha, os dois motores da União Europeia (UE), estão em crise de governo. Outros países, como a Espanha, têm governos sem maioria no Parlamento. Há um processo de fragmentação política, com a ascensão de novos paridos, o que dificulta a formação de governos estáveis e eficazes. Isso prejudica a condução da política econômica, reduz a confiança e tende a gerar crescimento menor.

Na Alemanha, a coalizão de governo de Olaf Scholz ruiu no começo de novembro, e o premiê social-democrata decidiu antecipar eleições para fevereiro (originalmente estavam previstas para setembro de 2025).

França e Alemanha são os dois países mais populosos, as maiores economias e as forças motrizes políticas da UE. É muito difícil que algo importante seja aprovado na UE sem anuência e um acordo prévio entre esses dois países. Isso ficou claro nesta reta final de negociação do acordo comercial entre UE e Mercosul. Há o risco de o acordo não ser assinado devido à objeção francesa.

Agora, pela primeira vez desde a Segunda Guerra Mundial, Alemanha e França estão em crise de governo ao mesmo tempo. E com uma chance considerável de que a instabilidade política perdure.

Mas não são apenas esses dois pesos-pesados que estão em dificuldade. Vários países da UE têm atualmente coalizões frágeis e/ou governos sem maioria nos respectivos parlamentos. Entre eles estão a Espanha (quarta maior economia do bloco), Portugal, Suécia e Dinamarca. Alguns países, como a Dinamarca, têm uma tradição de governos minoritários e funcionam bem assim. Mas essa não é a norma. O mais comum é que um governo sem maioria no Parlamento tenha dificuldade em avançar com suas políticas. O processo decisório emperra.

Por trás dessa onda de instabilidade na Europa está uma fragmentação política crescente. Durante décadas, a maioria dos países da Europa ocidental costumava ter dois partidos dominantes (um mais à esquerda e um mais à direita). Era o que acontecia na Espanha, por exemplo, com o Psoe (socialista) e o PP (liberal-conservador). Ou na Alemanha, com o CDU (democrata-cristã) e o SPD (social-democracia). Mas isso acabou.

O cenário político foi aos poucos se fragmentando, com a ascensão de novos partidos, da extrema-direita (como o AfD, na Alemanha) à extrema-esquerda (como o Podemos, na Espanha). Houve ainda o surgimento e/ou crescimento de partidos regionais, ligados ao território, como o Junts (na Catalunha), de partidos de interesses específicos (como o Movimento Agricultor-Cidadão na Holanda, ligado aos produtores rurais) e de partidos antissistema, como o M5S na Itália.

Na primeira eleição deste século, em 2002, os dois maiores partidos franceses elegeram, juntos, 497 dos 577 deputados da Assembleia Nacional. Na eleição de julho deste ano, as duas maiores coligações (formadas por mais de um partido) somaram apenas 339 deputados.

Na Alemanha, desde 1957, os governos eram formados por apenas dois partidos. Até que, na última eleição, em 2021, Scholz foi obrigado a formar uma coalizão que juntou social-democratas, verdes e liberais. À época se previa que seria difícil manter um governo coeso e coerente com divergências programáticas tão grandes e que era improvável que essa coalizão chegasse ao fim da legislatura. Foi o que ocorreu. Segundo pesquisas de intenção de voto, há uma boa chance de que o próximo governo alemão também precise formar uma coalizão tripla.

É muito provável que essa dificuldade crescente de governar esteja prejudicando a economia europeia. Muitos países, como França e Espanha e Itália, estão com elevado déficit fiscal, e a fragilidade político dos governos dificulta um ajuste. A UE prevê crescimento de apenas 0,9% para o bloco neste ano, após 0,4% em 2023. A projeção para 2025 também é baixa, de 0,8%. A economia alemã deve fechar 2024 em recessão.

Essa situação é particularmente perigosa num momento de elevada tensão entre as duas maiores economias mundiais, EUA e China. O presidente eleito dos EUA, Donald Trump, já ameaçou elevar tarifas de importação de produtos europeus. A UE corre o risco de ficar no meio do tiroteio econômico entre os dois gigantes.

Uma resposta para isso seria ampliar as relações econômicas com outras partes do mundo. O acordo UE-Mercosul é estratégico para os europeus nesse sentido, mas corre o risco de não avançar por causa do fragilizado governo francês.

Parlamento francês aprova uma moção de censura contra o primeiro-ministro Michel Barnier — Foto: Michel Euler/AP

Fonte: Externa

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